segunda-feira, 24 de maio de 2010

Cachoeiras e cascatas, de colorido sutil

Lucas Franco
Há pelo menos umas duas semanas, tem rolado pela Internet um inusitado projeto para as olimpíadas de 2016: a “Solar City Tower”, uma cachoeira artificial gigante em cima de uma pequena ilha no Leme.
Sob o pretexto da geração de recursos energéticos limpos, e o mote dos JJOO de 2016, um grupo de arquitetos suíços aproveita para deixar o seu marco na paisagem carioca, com talento e delicadeza capazes de encher os olhos do mais nobre sheik árabe.
Pelos mesmos motivos, e graças a Deus, é evidente que se trata de uma provocação, um projeto “conceitual”, e que não existe a menor chance de acontecer.
Entretanto, é muito provável que nos próximos anos, outras novas propostas conceituais apareçam, porém, com maiores ambições construtivas.

Veja aqui e aqui a proposta da “Solar City Tower”.

Eu por exemplo, também tenho algumas propostas para a nossa cidade, mas talvez por conhecer melhor a cidade do que os meus colegas suíços, e também por possuir maiores ambições quanto as suas realizações, prefiro propor a manutenção emergencial de obras já construídas.

Primeiro, se o barato é a queda d’agua, por que não recuperarmos os belos chafarizes da cidade, hoje secos, sujos e abandonados, como denunciou recentemente o jornal O Globo?

Veja a matéria do Globo: Por que secou?

Mas se a idéia for a de criar um marco na paisagem, eu tenho uma imbatível: a estátua do Cristo Redentor. Sim, aquela que está lá há uns oitenta anos, mas noutro dia amanheceu toda pichada por delinquentes noturnos. E o acesso? Desde as chuvas de abril que o trenzinho está interditado, e ainda não temos previsão de retorno.

E por último, se é para gastar dinheiro e ser ecologicamente correto, sugiro que antes de empenharmos qualquer centavo com uma pretensiosa cachoeira artificial de tecnologia suíça, deveríamos investir e trabalhar pela despoluição da Baía de Guanabara, ou ainda, tentar ao menos oferecer segurança para a população frequentar as inúmeras cachoeiras naturais que a nossa cidade possui.

Enfim, com a luz amarela acesa, fiquei pensando na seguinte questão: para 2016, será que vamos conseguir arrumar a nossa cidade ou apenas assistiremos a uma série de novas “cascatas”?

7 comentários:

  1. muito bem colocado... minhas esperenças são grandes... não deixo de acreditar !

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  2. Realmente tem toda razão. Esta cidade somente precisa do básico funcionando bem para ser maravilhosa. Não tem que ficar inventando ou especulando panacéias. O que vamos fazer com a cidade da musica afinal? põe uma cachoeira lá.

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  3. Lucas!
    Gostei muito do seu artigo. Acho que ele levanta uma questao bastante interessante na discussao sobre o futuro da arquitetura e do urbanismo do Rio e de outras cidades em geral.
    Pelo que eu entendi, voce classifica projetos de arquitetura/urbanismo como conceituais ou realistas. E que o projeto do predio/cachoeira do Leme se enquadra no primeiro grupo. Porem, nao acredito que esta classifcacao deva ser ou/ou. Acho que a combinacao das duas seria bem mais interessante. A meu ver, projetos conceituais (os bons) lidam com problemas concretos e muito embora proponham solucoes pouco realistas, cabe a nos arquitetos/urbanistas interpreta-las corretamente. Quero deixar claro que nao sou a favor do projeto suico, porem, ate que ponto voce acha que a questao em relacao a era "post oil" ja esta incorporada na agenda da cidade, e principalmente nos projetos atualmente concebidos para o Rio? E ate quando iremos discutir sobre a despoluicao da Baia da Guanabara, e outros problemas semelhantes que nao cabem a nos, arquitetos, resolvermos?
    Abracos,
    Isabela Ledo
    (ps: desculpe-me pela falta de acentos)

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  4. Luiz Fernando Janot25 de maio de 2010 às 16:56

    Caro Lucas,
    Sempre oportuno abrir à discussão projetos de arquitetura ou de urbanismo lançados na mídia, mesmo sendo eles "conceituais" como vc se referiu. Como vc, eu me preocupo com os efeitos - para o bem e para o mal - dessa "haute architecture" deslumbrada por natureza. E, como mencionado em um dos comentários acima, preocupo-me também com essa arquitetura "post oil" que, na verdade, vem sendo utilizada como paradígma do "politicamente correto" pelo inescrupuloso mercado financeiro internacional que afere lucros incalculáveis com a implementação de "prédios inteligentes (?)" onde, muitas vezes, não há a menor necessidade de serem construídos. Veja Dubai e essa mísera ilha em Copacabana !!!!
    Abs
    LF Janot

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  5. Lucas,
    Parabéns pela iniciativa de expor suas opiniões em praça pública!
    Apesar de concordar com você sobre a extrema necessidade de obras mais importantes para o nosso dia a dia de carioca, tenho minhas dúvidas sobre a propriedade do seu temor em relação a "outras novas propostas conceituais apareçam, porém, com maiores ambições construtivas" que me soa um tanto bairrista e destoa do que acredito ser importante no papel desempanhado pelo arquiteto hoje diante dos desafios de uma metrópole contemporânea internacional como o Rio. Faço-lhe a velha ressalva do 'nem oito, nem oitenta'!
    Forte abraço,
    Guilherme Lassance.

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  6. Grande Lucas,

    Vejo que cheguei atrasado pra nossa discussão, mas você já sabia que sou pró-cascata. E não só pelo fato de ser jornalista...

    Não sou necessariamente a favor desta cascata específica, mas da possibilidade de se construir coisas assim sem que pareça à sociedade uma heresia. Sou a favor de monumentos, mesmo na cidade mais linda do mundo. E pode haver vários - nossa própria geografia prova isso, com suas múltiplas paisagens deslumbrantes.

    Mas também os monumentos construídos funcionam: Brasília é cidade-monumento, e aí está sua graça; Bilbao só entrou no mapa-múndi depois que fez o Guggenhein; Niterói ganhou um cartão postal diferente da vista pro Rio quando o museu-nave espacial aterrissou.

    Sou a favor até do Obelisco do Casé, pra você ter uma idéia! E tenho certeza de que se a estátua do Cristo não tivesse sido construída em 1931, em 2010 com certeza não seria. A opinião pública vetaria.

    E, pela lógica das prioridades, o bondinho do Pão de Açúcar só poderia existir depois que todas as favelas acima da cota 100 fossem equipadas com teleféricos.

    Bem antes do cascatol suíço, tive a idéia de fazer um farol de 300 metros de altura perto das Cagarras (já que lá não pode), inventando um novo ponto de vista para (e sobre) a cidade. Na verdade seria um grande aquário panorâmico com restaurante/boate/hotel lá em cima, servido por uma linha de barcos. Claro que inventei isso só pra apavorar os amigos - principalmente os arquitetos. Mas se tiver interesse em saber mais detalhes sobre este projeto, me liga!

    Um abraço deste faroleiro,

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  7. Meus caros, não pretendia iniciar uma cruzada contra os projetos conceituais, nem colocá-los em cheque, em um confronto derradeiro com os projetos "realistas". Os projetos conceituais / experimentais são fundamentais para o desenvolvimento não só da arquitetura como das mais diversas disciplinas artísticas, da ciência e da tecnologia.

    O meu alerta, e aí aproveito para fazer uma analogia com a Moda, outra que através dos desfiles também bebe na fonte das propostas conceituais, seria para não corrermos o risco de organizar um belo desfile, antenado com as mais novas tendências internacionais e irmos todos assistir desnudos, pois nos esquecemos das mais simples vestimentas cotidianas.

    Muitos abraços e um sincero obrigado por terem dado continuidade a discussão,
    Lucas.

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